Embora o realizador indiano Rahul Jain não se tenha proposto a fazer um filme político, o seu premiado “Machines” está a atrair a atenção internacional devido à sua representação da miséria e do sofrimento humano que sustentam a indústria de vestuário.
O documentário de Jain inaugurou a Copenhagen Fashion Summit (ver O calcanhar de Aquiles da moda), evento no qual se reuniram executivos de marcas de vestuário líderes, instituições de solidariedade social e políticos para discutir a moda ética e sustentável.
No filme, o realizador Rahul Jain apresenta um retrato íntimo do ritmo de vida e de trabalho de uma gigantesca fábrica têxtil em Gujarat, Índia. Movendo-se pelos corredores e entranhas da estrutura, a câmara imerge o espectador num espaço de exploração laboral e de trabalho infantil, provocando uma reflexão sobre as condições de trabalho da cadeia de aprovisionamento global.
Desde a década de 1960, a região de Sachin, no oeste da Índia, sofreu uma industrialização sem precedentes e sem regulamentação, exemplificada nas suas inúmeras fábricas têxteis. “Machines” retrata uma dessas fábricas, mas representa os milhares de trabalhadores que trabalham na ITV indiana.
Com linguagem visual forte, imagens marcantes e entrevistas cuidadosamente selecionadas dos próprios trabalhadores, Jain conta uma história de desigualdade e opressão, de seres humanos e máquinas. A fábrica emprega 1.500 trabalhadores e alguns são vistos a dormir em pilhas de tecidos.
«Os trabalhadores eram pobres, estavam doentes e tossiam muito, vários tinham problemas de audição», recorda Jain, estudante no Instituto de Artes da Califórnia, em declarações à agência Reuters.
O ruído das máquinas ao qual aqueles trabalhadores são expostos serve como banda sonora do filme.
«Os trabalhadores usavam fones com música alta para bloquearem o som (das máquinas), mas isso causa-lhes ainda mais danos. Os seus pulmões estão danificados porque respiram poeira de sílica e também partículas de carbono», destaca Jain.
O realizador de 25 anos, que cresceu em Deli, passou quase seis meses (espalhados por três anos) a filmar dentro da fábrica, junto de trabalhadores que ganham menos de 3 dólares (aproximadamente 2,68 euros) por turnos de 12 ou mais horas. O filme termina inclusivamente com os trabalhadores a pedirem a Jain para ajudar na sua luta por turnos de oito horas.
Rahul Jain ressalvou que ainda que “Machines” não tenha sido filmado com um propósito ativista, espera que o governo tome medidas para ajudar os trabalhadores da indústria têxtil e de vestuário do país.
Lançado no final de 2016, o filme ganhou o prémio do júri para melhor fotografia no Festival de Cinema de Sundance este ano. “Machines” já estreou na Grã-Bretanha e estreará na Índia no final do corrente ano. Jain adianta que as projeções estão a ser planeadas para as cidades industriais com maior densidade populacional do país. «Espero que, no fundo, [o filme] seja usado para mostrar ao governo o que ele não quer ver», conclui.
in Portugal Têxtil